*Daniel Menezes
“Não há exercício da cidadania sem a formação educacional, e não há educação efetiva sem a preparação das pessoas para defenderem seus direitos e cumprirem com seus deveres. Educação e cidadania são pautas interseccionadas na nossa Constituição e devem ser objeto de defesa permanente por governantes, pela sociedade civil e pelo judiciário” (Min. Geraldo Og Nicéas Marques Fernandes).
Desde que me entendo por gente, e lá se vão 35 anos, ouço, em ano eleitoral, os pré-candidatos a cargos eletivos alvoroçados com o oportuno discurso de que a educação é a saída para desigualdade social, a única solução para o Brasil, que investimento em educação não é gasto, e por aí vai. A realidade, porém, não é inexoravelmente esta, basta notar o distanciamento que há entre a alocução política e a práxis.
Em 2022, o Brasil passou a ocupar as últimas posições do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), exame promovido pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), nada mais, nada menos que o sistema de avaliação educacional de ensino básico mais importante do mundo. Como resultado, chegou-se à conclusão de que metade dos alunos na faixa de 15 anos não têm capacidade de compreender o que leem, não sabem resolver problemas matemáticos simples e não são capazes de propor ideias inovadoras.
De igual sorte, malgrado a Constituição assegure, em seu artigo 214, a elaboração, a cada dez anos, do Plano Nacional de Educação (PNE) – a propósito, deveria ser a nossa agenda política educacional, sobretudo em razão de seus objetivos (aqui, a título de conhecimento, amigo leitor, sugiro a leitura da Lei nº 13.005/14) -, o que se vê, na prática, é um cenário abissal de desrespeito sistêmico às suas metas. À guisa de exemplo, (I) em 2016, com o advento da Emenda Constitucional nº 95, também conhecida como “PEC do Teto de Gastos”, o PNE foi preterido nos orçamentos; (II) em 2019, segundo notícia publicada no sítio da Folha de São Paulo, em 16 de agosto, o ministro da Educação à época, Abraham Weintraub, aduziu que R$ 926 milhões do orçamento da Educação havia sido usado para pagar emendas; (III) no ano passado, 2023, de acordo com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), 9 milhões de estudantes não conseguiram concluir o ensino médio. Destes, 41,7% dos jovens entre 14 e 29 anos abandonaram a escola pela necessidade de trabalhar, o que corresponde a 1,5 ponto percentual em comparação com 2022.
Quer dizer, apesar de o direito à educação estar previsto na Declaração Universal dos Direitos Humanos (art. 26), no Pacto Internacional de Direitos Sociais, Econômicos e Culturais (arts. 13 e 14), na Constituição Federal de 1988 (arts. 6º, 22, XXIV, 23, V, 24, IX, 30, VI, 205, 206 e seus incisos, 208 e seus incisos, 211, 212, 212-A, 214 e seus incisos, 242, §1º), na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96), entre outros diplomas legais, as ações do poder público demonstram-se desconectadas das promessas políticas.
Por último, retomando o primeiro parágrafo, cabe um parêntese: a asserção de que a educação é a saída para desigualdade social é falsa, uma vez que, dessa forma, a gente individualiza a desigualdade. Ora, quando determinado indivíduo melhora as suas condições de atuar no mercado de trabalho, pode-se inferir que a desigualdade será atenuada, mas não erradicada. Logo, a oferta do direito humano fundamental social à educação, embora seja um dos mais importantes passos para redução das desigualdades sociais, não é por si só a solução.
Paulo Daniel Ferreira de Menezes é Bacharel em Direito e aprovado no XL Exame de Ordem Unificado da Ordem dos Advogados do Brasil – FGV. Licenciando em História. Pós-graduado com especialização em Direito Administrativo pelo Instituto Pedagógico de Minas Gerais – IPEMIG (2022). Especialista em Direito Constitucional Aplicado e Direito Trânsito pela faculdade Legale (2022). Estudou Aperfeiçoamento em Processo Administrativo na Fundação Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal e Território (2024), Direito Educacional na Unifaveni (2024) e “Compliance Digital e Proteção de Dados” na Damásio (2024).